Relato de Liège Gautério sobre sua participação no XX Jogos Mundiais para Transplantados

Instituto Unidos pela Vida - 07/09/2015 00:56

DelegaçãoJá contamos a história de Liège e de sua preparação para os Jogos aqui. Agora chegou a hora de saber dela como foi estar na competição.

Não importa o quanto eu escreva, sei que não será o suficiente para descrever a sensação de viver um sonho, mas tentarei contar pra vocês um pouco dessa aventura.

O primeiro impacto foi na solenidade de abertura dos jogos, dia 23 de agosto. Ver as delegações (1.100 atletas de 45 países diferentes) foi mágico. Tive a honra de entrar carregando nossa bandeira. Senti muito orgulho. Ali, naquele momento, tive a noção da dimensão do evento. Não imaginava que fosse algo tão organizado, tão grandioso, tão divulgado entre outros países. Também pensei em tudo o que passei até aquele momento. Fraturei o tornozelo no final de 2014, fiquei imobilizada até janeiro, voltei a treinar em fevereiro, porém, precisei imobilizar novamente e só voltei realmente a treinar dois meses antes da competição. Além disso, descoberto um câncer de mama em maio o que me tirou um pouco do foco e fez com que eu desacelerasse meu ritmo de treinos.

A competição

pódium prataSexta-feira, 28 de agosto – É chegado o grande dia e eu pensei: Agora não tem volta, “vai lá e faz o teu melhor”, eu dizia pra mim mesma. Fazia frio e o tempo estava encoberto, mas nem isso me fez desanimar.
Na minha categoria havia seis atletas nos 100m e 200m rasos então pensei: Uau! Sou a sexta melhor do mundo!

Dado o tiro de largada não vi mais nada. Lembrei dos meus treinos, da técnica que devia utilizar e fui. Afinal de contas, não há muito o que pensar em 14.3 segundos. Quando vi que ninguém se aproximava de mim a única coisa que passava na minha cabeça era: “Não acredito! Não acredito! Vou ser ouro!”

Cruzar a linha de chegada e alçar os braços ao alto em sinal de agradecimento foi o que me restou fazer.

Sensação de missão cumprida. Corri pela família TX pulmonar, pelos que já fizeram, pelos que esperam e pelos que partiram. Feliz em poder saber que uma transplantada unilateral de pulmão pode ir mais. Nesses jogos os transplantados de pulmão são raros, segundo um fisioterapeuta argentino que, surpreso por me encontrar no atletismo, me chamou para conversar.

No sábado, os 200m. Estava decidida a não fazer, já que não havia treinado. Minha inscrição acabou acontecendo apenas por insistência dos amigos. O dia amanheceu ensolarado e mais quente do que a véspera. A vontade veio e não deu pra escapar. Minha estratégia foi a de largar o mais lento possível e ver se teria fôlego para o resto. Na medida em que sentia que tinha máquina, fui imprimindo ritmo e buscando. Cheguei em segundo lugar. Com um tempo de 34.1 segundos atrás apenas de Petra Vovesna, atleta da República Tcheca que completou a prova em 32,4s.

pódium ouroFiquei realmente muito satisfeita e honrada de ter sido a primeira mulher brasileira a participar dos jogos e de ter conquistado a primeira medalha de ouro para o Brasil em 20 edições dos Jogos.

Fiquei feliz por poder estar lá. Ao mesmo tempo, senti tristeza por saber que no Brasil a maioria das pessoas sequer sabe que os jogos existem. Não recebemos nenhum apoio, nenhum incentivo. Nosso time era extremamente reduzido, enquanto outros países contavam com seus médicos e fisioterapeutas. Não é possível um país imenso contar com apenas quatro atletas (dois no tênis, que conseguiram medalha de prata e bronze e dois no atletismo). Somos um país repleto de praticantes de atividade física. É preciso haver um projeto que contemple e incentive o esporte para transplantados. Conseguimos, a muito custo, nosso uniforme e nada mais.

Espero poder colaborar para mudar esse cenário e continuar divulgando o esporte entre as pessoas transplantadas.

Prólogo

O clima em Mar del Plata e em especial o contraste entre o frio na ruas e nos locais de competição e o calor do ar condicionado do hotel e dos ônibus usados no transporte fez com que eu voltasse com uma crise alérgica que me levou direto para emergência o que não é nada bom para um organismo imunosuprimido. Ainda assim, penso em continuar competindo, só avaliando melhor o clima e condições dos locais das competições.

Nota importante: As informações aqui contidas tem cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e ou, o tratamento médico. Em caso de dúvidas fale com seu médico, ele poderá esclarecer todas as suas perguntas.

Fale conosco