Gestação na Fibrose Cística | Entrevista com Dra. Mônica Firmida

Instituto Unidos pela Vida - 12/04/2017 18:00

MRiyzst8Confira a entrevista concedida pela Dra. Mônica Firmida, médica pneumologista do Ambulatório de Fibrose Cística da UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro e uma das palestrantes do VI Congresso Brasileiro de Fibrose Cística, na mini conferência sobre Gestação em Fibrose Cística. 

Unidos pela Vida: Qual o panorama atual da gestação na Fibrose Cística?

Dra. Mônica: A gente vem vivendo uma realidade hoje bastante diferente do passado. No Brasil, estamos começando a viver um crescimento muito grande da população adulta com FC. Hoje, no Rio de Janeiro, em torno de 25% dos pacientes em nosso ambulatório são adultos, o que representa 70 pacientes em acompanhamento regular. Os pacientes não só estão vivendo mais, como estão realmente vivendo melhor.

Como um ciclo natural da vida, temos muitas pacientes, principalmente entre 20 e 30 anos, querendo ser mães, profissionais e também desejando e fazendo vários outros planejamentos de vida, que são super naturais para todos nós.

Unidos pela Vida: Quais aspectos devem ser levados em consideração pela paciente antes de engravidar?

Dra. Mônica: Um dos nossos desafios em relação às pacientes é promover, como sempre, a adesão ao tratamento. Não é nosso papel interferir na decisão de ser mãe, a não ser com esclarecimentos técnicos e com o apoio que for necessário de toda a equipe. Cada gestação é muito individual. Seu bom andamento irá depender da condição clínica que a paciente tem, de como ela adere ao tratamento, de que tipo de suporte familiar ela tem. Mas uma questão é fato: a adesão ao tratamento é fundamental para que tenhamos sucesso, independente da gravidade do quadro clínico dessas pacientes. Enfatizamos muito isso!

Outra questão é que, às vezes, a paciente pensa em engravidar como se engravidar fosse quase “brincar de casinha”. Ela pensa muito no momento em que quer estar grávida, no momento em que quer ter o bebê, mas é muito importante conversar sobre como vai ser o momento posterior também, porque sabemos que não é fácil a sobrecarga.

Depois do nascimento, a mãe terá que lidar com um filho pequeno, com as inúmeras demandas específicas do bebê, com a administração do tratamento dela e muitas vezes com situações de trabalho. Essa é uma questão um pouco difícil de discutir, mas que é bastante necessária. Por isso, é fundamental que se pense se elas tem o apoio da família também, pois as situações são muito variadas.gestante2

Como eu falo para as nossas pacientes, hoje já vivemos uma realidade em que a paciente não precisa viver pensando que vai morrer de Fibrose Cística. Lidamos com uma doença crônica, com prognóstico muito individual. O que existe, sem dúvida, é um risco, baseado na expectativa de vida, de que essa criança não chegue a vida adulta com a mãe viva. Esse é outro ponto difícil, mas que deve ser muito abordado para que seja cuidado com responsabilidade.

Unidos pela Vida: O que muda no tratamento da Fibrose Cística durante o período de gestação das pacientes? 

Dra. Mônica: As pacientes costumam ter muitas dúvidas em relação às medicações. A imensa maioria das medicações usadas rotineiramente no tratamento da Fibrose Cística podem ser perfeitamente continuadas no decorrer da gestação, uma ou outra precisa de algum ajuste. Além disso, já temos material técnico disponível suficiente para poder cuidar da paciente de uma forma segura.

O que recomendamos é um acompanhamento mais estreito. Numa paciente adulta estável, as consultas de rotina são realizadas, em média, a cada três meses. No caso da gestante, o acompanhamento precisa ser, no mínimo, mensal. Ocasionalmente, as consultas precisam ser ainda mais frequentes. Isso é bastante importante, já que cada situação é minimamente importante. Precisamos estar atentos a todos os detalhes: no cuidado nutricional, principalmente se a paciente for diabética, se a paciente tiver hepatopatia ou alguma outra manifestação extrapulmonar da Fibrose Cística e também nos casos em que a paciente tem uma função pulmonar pior.

Unidos pela Vida: Quais os riscos da gestação para as mulheres com Fibrose Cística em comparação a mulheres que não tem a doença

Dra. Mônica: Temos uma expectativa de que a gravidez, pelo crescimento da barriga, irá piorar um pouco a questão da condição respiratória. Esse é um detalhe que a gente precisa dar muita atenção. Mas, em geral, o que nossa experiência vem demostrando e o que temos visto no mundo é que o risco que as pacientes com Fibrose Cística enfrentam em uma gestação é muito semelhante ao risco enfrentado pelas mulheres da população em geral.

O que elas precisam, ao final das contas, é de um cuidado de seguimento, mas elas podem perfeitamente conduzir a gestação com um prognóstico muito melhor do que o que tínhamos há décadas atrás.

Unidos pela Vida: Quais as principais preocupações da equipe de profissionais que cuida das mulheres com Fibrose Cística?

Dra. Mônica: Nós sempre somos, de certa forma, vistos como os que tomam conta da paciente e brigam se ela não estiver se tratando direito. Algumas vezes, a gente sabe que tem pacientes que, ou pensam em engravidar e não falam por algum tipo de medo (como o de ser proibida de engravidar naquele momento, o que é errado pois, independente do caso, a equipe tem dar todo o suporte adequado) e também de pacientes que acham que não podem engravidar porque tem Fibrose Cística, o que também é errado pois a infertilidade está em uma minoria de mulheres. Em geral, a gente sempre considera que a paciente seja fértil.

Com base nisso, o que a gente consegue ver no dia a dia e que me preocupa bastante, particularmente, é o fato de termos muitas mulheres em idade fértil que não praticam sexo seguro, não usam nenhum tipo de proteção anticoncepcional nem de métodos de barreira, afinal nossa preocupação não é apenas com a prevenção da gestação, mas com outras doenças com DST, Aids, etc.

Unidos pela Vida: Como é o parto das gestantes com Fibrose Cística?

Dra. Mônica: O objetivo é que sempre seja parto normal, qualquer situação que saia dessa possibilidade é de discussão extremamente individualizada. Inclusive o guideline (diretrizes) disponível para o mundo todo para o seguimento de gestante com fibrose cística aborda especificamente esse aspecto. Algumas podem precisar em algum momento de indução do parto por conta da saúde materna ou fetal. Algumas precisam de uma facilitação da segunda fase, que é o período mais expulsivo do parto, mas a imensa maioria pode perfeitamente ter parto normal e ele deve ser estimulado. A cesárea, como em qualquer outra mulher, traz mais riscos que o parto natural.

Unidos pela Vida: Qual o seu recado para as pacientes que desejam engravidar? 

Dra. Mônica: O que enfatizamos é a necessidade desse acompanhamento controlado, protegido e também responsável. Se a paciente engravida sem planejamento pode ser um pouco mais difícil conseguirmos o equilíbrio que a gente precisa. Mas enfatizo que ela nunca tenha medo de se aproximar da sua equipe! O nosso papel sempre é cuidar, independente do que seja, mesmo nas situações mais dramáticas. Nós vivemos uma situação assim lá na UERJ em que falamos para a paciente: “- A gente está num túnel que a gente não sabe qual é a luz lá no fim, mas pode ter certeza que no túnel todo a gente vai estar junto!”. Acho que esse é o nosso papel!

Agradecemos à Dra Mônica Firmida pela importante participação e entrevista! =)

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Nota importante: As informações aqui contidas tem cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e ou, o tratamento médico. Em caso de dúvidas fale com seu médico, ele poderá esclarecer todas as suas perguntas.

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