GANHA, MAS NÃO LEVA? Um ano de incorporação do Kalydeco no Brasil

Comunicação IUPV - 08/12/2021 17:52

Por Marise Basso Amaral, Diretora Geral do Unidos pela Vida

Há um ano, exatamente no dia 8 de dezembro de 2020, o Kalydeco, um modulador da proteína CFTR, indicado para algumas mutações do gene CFTR, que resulta numa doença chamada fibrose cística, foi aprovado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) para ser incorporado ao SUS.

O que isso quer dizer? Significa que algumas pessoas com fibrose cística, com as mutações que respondem ao tratamento com esse medicamento, passariam a recebê-lo pelo Sistema Único de Saúde, gratuitamente, e poderiam ter a “história natural” de sua doença TRANSFORMADA. Significa que a Conitec julgou o medicamento eficaz, seguro e custo-efetivo. Significa que as mais de dez mil contribuições de familiares, pessoas com fibrose cística, amigos e mais de 300 contribuições de profissionais de saúde fizeram a diferença, revertendo a decisão inicial que havia sido desfavorável à incorporação. Significa que hoje, um adolescente com doze anos, elegível para esse tratamento, vai poder fazer planos para o futuro como qualquer outro. Porque agora ele vai poder continuar respirando a plenos pulmões.

“Respirar a plenos pulmões” é uma expressão que todos nós passamos a entender melhor nos últimos dois anos após a pandemia da covid-19. Entendemos muito melhor o que é estar em risco, estar sujeito, a qualquer momento, à uma doença que em poucos dias, destrói sua capacidade respiratória, além de uma série de outras comorbidades. Aprendemos o que é ter que fazer fisioterapia respiratória, reabilitação. Aprendemos a ler artigos científicos, acompanhar pesquisas, acompanhar experts e a torcer e esperar por uma solução. Nesse intervalo, muitos se perderam no caminho, entre as garantias de falsos tratamentos e discursos negacionistas. Muitos morreram em função da falta de uma política de saúde comprometida com a preservação da vida das pessoas. Para essa dor coletiva não existe medicamento.

Conhecemos, em menor escala, essa experiência. Sabemos desde sempre, o que é estar em risco, sabemos o que é esperar pela ciência, pela pesquisa, por novos tratamentos. Sabemos também, infelizmente, o que é ver essas coisas avançarem APENAS em outros países. Ver a mediana da expectativa de vida para pessoas com fibrose cística aumentar para 50 anos, no hemisfério norte, enquanto por aqui, ela não passa dos vinte anos. Aqui, apesar de alguns avanços, seguimos morrendo cedo demais. E morrendo assim, devagar, perdendo função respiratória, internando cada vez mais para dar conta de bactérias cada vez mais ameaçadoras, com antibióticos cada vez menos eficazes contra as ameaças. Pacientes, familiares, médicos e associações fazem o melhor que podem, mas isso não tem sido o suficiente, nem de longe.

Façam um exercício de ficção. Imaginem que alguém te dissesse assim: “Temos a vacina para a covid-19, mas vocês vão ter que esperar porque ela é muito cara. Ela vai estar disponível só para alguns. A vacina é ótima, segura, eficaz, mas não é custo-efetiva, portanto, não é para vocês”. Como vocês se sentiriam? Quanto vale a vida?

É o que acontece conosco. Somos raros, somos caros. Somos também ignorados, postergados, somos até culpabilizados pela nossa doença e pelos custos que “causamos”. E somos nós que temos que brigar em todas as instâncias contra tudo e contra todos para termos nosso direito assegurado. O direito a um futuro, o direito a uma vida boa. Direito, não “privilégio”, como dizem alguns.

A vida é um sopro, um piscar de olhos. A nossa, com certeza. A sua, também. Acontece que no nosso caso essa fragilidade é mais palpável. A cada dia, semana, mês, ano, perdemos função pulmonar, aumentamos o risco de diabetes relacionada à fibrose cística, desnutrição, osteoporose, complicações no fígado, falência do pâncreas e comprometimento dos rins em função de longos tratamentos com antibióticos e antiinflamatórios. Não temos um minuto a perder.

Em dezembro de 2020 tivemos uma grande vitória, construída nos meses anteriores onde associações de pacientes, profissionais de saúde, familiares, pacientes, amigos, se envolveram num trabalho qualificado e exaustivo de educação científica e política. De entender desde a ciência de precisão até os processos e etapas envolvidos na incorporação de um medicamento novo. CONSEGUIMOS, GANHAMOS!!! NOSSO PLEITO TEVE RECOMENDAÇÃO FAVORÁVEL.

Só não conseguimos entender o porquê de as pessoas elegíveis a esse tratamento, passado um ano dessa recomendação, não receberam ainda o medicamento, mesmo quando a lei prevê que, após a publicação desta incorporação no diário oficial, ele deve ser disponibilizado pelo SUS em até 180 dias! Eles ainda seguem piorando, internando, perdendo tanto, mesmo o medicamento deles tendo sido incorporado no SUS. Por quê? Alguém aí se importa?”

Status atual: O Unidos pela Vida vem buscando constantemente buscar informações junto ao Departamento de Assistência Farmacêutica (DAF) – Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos – SCTIE do Ministério da Saúde – MS, qual o status de compra e dispensação desta medicação junto ao SUS, considerando que um ano já se passou e nenhum paciente do Brasil já o recebeu via SUS. Seguimos buscando informações e compartilharemos tão logo tenhamos.

Nota importante: As informações aqui contidas têm cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e/ou o tratamento médico. Em caso de dúvidas, fale com seu médico.

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