Estudo aponta que vírus que infecta a P. aeruginosa desvia a atenção da resposta imunológica sobre a bactéria
Comunicação IUPV - 09/02/2020 13:48Um novo estudo mostra que a Pseudomonas aeruginosa, a bactéria mais comum encontrada em pacientes com Fibrose Cística (FC), utiliza um vírus para passar despercebida pelo sistema imunológico do hospedeiro.
O tratamento com uma vacina delineada para ajudar o sistema imunológico a detectar o vírus mostrou redução significativa da capacidade de a P. aeruginosa em infectar camundongos, sugerindo que essa pode representar um novo meio para tratar pacientes com FC.
O estudo “Bacteriophage trigger antiviral immunity and prevent clearance of bacterial infection” (Bacteriófagos desencadeiam a imunidade antiviral e previnem a eliminação da infecção bacteriana) foi publicado na revista Science.
A P. aeruginosa, que pode afetar pessoas com FC, também é comum nas úlceras diabéticas, escaras e queimaduras. Neste momento não há vacina aprovada contra essas bactérias, que estão se tornando cada vez mais resistentes aos antibióticos. A Organização Mundial da Saúde classificou a P. aeruginosa como um dos patógenos mais perigosos para a saúde humana.
“Vejo isso diariamente na minha prática clínica”, disse o Dr. Paul Bollyky, professor assistente de doenças infecciosas, microbiologia e imunologia na Stanford University School of Medicine, e autor sênior do estudo, em comunicado da universidade, escrito por Bruce Goldman.
Com frequência, a própria P. aeruginosa é naturalmente infectada por um vírus, conhecido como bacteriófago ou fago. Esse fago vive e se multiplica dentro das bactérias, e normalmente é liberado no ambiente circundante da bactéria.
“Sabemos há muito tempo que temos até dez quatrilhões de fagos em nosso organismo, mas acabamos de descobrir que, seja lá o que estivessem fazendo, será estritamente entre eles e as nossas bactérias comensais [a comunidade natural de bactérias, que vive em nosso corpo, e é vital à nossa boa saúde]”, disse Bollyky. “Agora sabemos que os fagos também podem entrar em suas células e causar doenças.”
A equipe analisou o teor de bactérias das amostras coletadas de 111 pacientes com ferimentos infectados que não cicatrizavam, e encontrou que em 37 casos os ferimentos estavam infectados por P. aeruginosa. Vinte e cinco dos 37 ferimentos infectados foram considerados positivos para um fago. Quanto mais tempo o ferimento persistia, maior era a porcentagem de bactérias infectadas por fagos. Os pesquisadores arrazoaram que os fagos não apenas coexistem com a bactéria P. aeruginosa, mas também a ajudam a infectar o hospedeiro.
Para provar a hipótese, a equipe infectou pequenos ferimentos na pele de camundongos com P. aeruginosa que eram ou não infectados com fagos. A equipe observou que quando a P. aeruginosa estava isolada, sem fagos, era necessário cerca de 50 vezes mais bactérias presentes para causar uma infecção em comparação com a P. aeruginosa infectada por fagos. A equipe acredita que essa parceria funciona porque a resposta imunológica é ativada contra o vírus, e não contra as bactérias.
As células imunes responsáveis por caçar bactérias são chamadas fagócitos. Essas células são capazes de “comer” bactérias (fagocitose), e demandam a ajuda de outras células imunológicas protetoras, quando necessário. Mas se os fagócitos perceberem um vírus, interromperão o processo de “comer”, e não protegerão mais o organismo contra as bactérias, como se, tendo o vírus dentro de si, os fagócitos também se infectassem.
Em testes laboratoriais, os pesquisadores observaram que a presença do fago na P. aeruginosa reduziu dez vezes o processo de “comer” pelos fagócitos, evitando a eliminação das bactérias dos ferimentos na pele. “Os fagócitos perderam o apetite”, disse Bollyky.
Para combater o vírus, o organismo reage naturalmente produzindo anticorpos que se ligarão às células que transportam o vírus, e promove a ativação de outras células autoimunes para destruí-las. Neste caso, a P. aeruginosa passa despercebida pelo sistema imunológico, porque o vírus induz a produção de moléculas sinalizadoras dentro dos fagócitos, que o impedirão de sinalizar a ameaça bacteriana.
Até certo ponto, o que o fago faz dentro dos fagócitos pode ser comparado com um alarme de incêndio quando, o caso seria ter chamado a polícia, disse Bollyky. “Se vinte carros de bombeiros obstruírem o local do crime, será mais fácil para o ladrão fugir”, acrescentou.
Para superar esse efeito inibitório dos fagos, a equipe delineou uma vacina visando uma parte da proteína de revestimento do fago, e a testou em camundongos infectados com P. aeruginosa. A vacina foi capaz de reduzir os ferimentos infectados por bactérias pela metade. Da mesma forma, a administração de anticorpos contra a mesma proteína fágica poderia reduzir a P. aeruginosa com a mesma eficácia.
De maneira geral, os achados mostram um papel direto dos fagos na promoção de infecções bacterianas, um fenômeno não restrito à P. aeruginosa, visto que outras bactérias também têm a capacidade de abrigar fagos semelhantes. Bollyky disse que as bactérias E. coli e Klebsiella pneumoniae também podem transportar fagos, e estes tendem a coinfectar ferimentos já infectados por P. aeruginosa.
Bollyky acredita que vacinar as pessoas contra fagos após um diagnóstico de FC ou diabetes pode protegê-las contra infecções por P. aeruginosa. A vacinação também deve ser estendida a pessoas em lares de idosos e hospitais, que têm maior risco de desenvolver escaras positivas para P. aeruginosa.
Se houver necessidade de respostas mais rápidas, outra estratégia inclui o uso de anticorpos direcionados ao fago, já que eles podem desencadear o sistema imunológico mais rapidamente que a vacina. Atualmente os pesquisadores estão solicitando a patente sobre a propriedade intelectual da vacina. Os planos incluem testes em animais maiores e, por fim, estudos clínicos.
Fonte: https://cysticfibrosisnewstoday.com/2019/04/02/virus-that-infects-bacteria-turns-immune-response-away-from-p-aeruginosa-study-shows/
Traduzido por Vera Carvalho, voluntária de tradução para o Instituto Unidos pela Vida. Vera é tradutora profissional com especialidade na área científica (carvalho.vera.carvalho@gmail.com).
Nota importante: As informações aqui contidas tem cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e ou, o tratamento médico. Em caso de dúvidas fale com seu médico, ele poderá esclarecer todas as suas perguntas.