Equilibrando a balança: o funcionamento do Judiciário brasileiro e o direito à saúde

Comunicação IUPV - 10/05/2024 07:15

A maioria dos cidadãos brasileiros já tiveram que recorrer ao Poder Judiciário por inúmeras razões. Mas afinal, como ele é estruturado?

A sociedade como um todo vive em um estado de desconhecimento sobre o funcionamento e a estrutura do judiciário. Embora façam parte do cotidiano de milhões de cidadãos, os detalhes sobre como os tribunais operam, sua organização e os processos que regem suas decisões frequentemente permanecem obscuros. Essa falta de compreensão pode criar uma lacuna significativa entre os cidadãos e o sistema legal, tornando difícil para muitos entenderem como acessar ou até mesmo pleitear seus direitos perante a justiça. Essa falta de familiaridade é ainda mais evidente quando se trata de questões relacionadas à saúde, onde a interação entre o judiciário e os direitos à saúde pode parecer distante ou inacessível para aqueles que mais precisam.

Quando falamos sobre saúde no Brasil, as primeiras coisas que pensamos são médicos, hospitais e medicamentos, sem imaginar que existe outro elemento crucial nesta equação que muitas vezes não é lembrado: o Poder Judiciário.

Como é estruturado o Poder Judiciário?

O Poder Judiciário brasileiro é estruturado em diversas instâncias para assegurar que as leis sejam aplicadas corretamente em todo o país. No topo, está o Supremo Tribunal Federal (STF), que zela pela Constituição e julga casos de alta relevância nacional. Logo abaixo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) unifica a interpretação das leis federais, exceto questões constitucionais. Os Tribunais Regionais Federais (TRFs) e os juízes federais tratam de matérias envolvendo a União e legislação federal em primeira e segunda instâncias. Cada instância contribui para manter a ordem jurídica e proteger os direitos dos cidadãos.

Quando o assunto tratado no processo não envolve a União ou alguma legislação federal, deve ser acionada a chamada Justiça Comum, que nada mais é que o Judiciário Estadual, presente em grande parte dos municípios brasileiros, através dos fóruns, que são divididos por varas.

Fóruns de cidades menores possuem apenas uma ou duas varas, que normalmente atuam de forma mais geral, chamadas de Vara Judicial, enquanto fóruns de cidades maiores possuem diversas varas, divididas entre Cível (assuntos do cotidiano, como contratos, relações de consumo), Criminais, Família entre outros.

Como o Judiciário intervém?

A intervenção do Judiciário ocorre através de um processo que começa quando uma parte apresenta uma demanda ou reclamação na justiça, conhecida como ação judicial. Esta parte, chamada de autor, solicita ao Judiciário que resolva uma controvérsia ou reconheça um direito, alegando que foi prejudicada de alguma forma. O réu, por outro lado, é quem deve responder à ação. O processo judicial é conduzido por um juiz ou um colegiado de juízes, que irão examinar as provas, ouvir as partes, testemunhas e, em alguns casos, especialistas.

Quando o processo é de caráter criminal, todavia, a propositura ocorre de forma diferente. É feita uma investigação policial, que, constatada a existência de possível crime, encaminha para o Ministério Público, órgão responsável por dar entrada nos processos criminais. O réu, neste caso, é o investigado, a pessoa que supostamente cometeu o crime.

Durante o processo, são aplicadas regras processuais específicas para garantir que o julgamento seja justo e imparcial. O juiz, ao final do processo, emite uma decisão, chamada de sentença, que pode determinar quem está certo no litígio e quais medidas devem ser tomadas para resolver a questão ou reparar os danos. Esta decisão é obrigatória para as partes e, se não cumprida, pode ser executada forçosamente com o auxílio do próprio Judiciário.

Alguns exemplos de possíveis ações relacionadas ao direito à saúde: recusa de planos de saúde privados a cobrir tratamentos, cirurgias, medicamentos ou procedimentos que deveriam estar inclusos no contrato; necessidade de medicamentos não disponíveis ou não aprovados pela Anvisa, mas que são essenciais para o tratamento de uma condição de saúde; situações em que o sistema público de saúde (SUS) não consegue fornecer tratamento médico em um tempo razoável; casos de negligência ou erro médico que resultam em danos à saúde do paciente.

Com relação a esta área específica do direito (direito à saúde), o judiciário pode determinar que esses serviços sejam fornecidos. Desta forma, juízes e tribunais se tornam peças-chave para resolver esses impasses, garantindo que a lei seja cumprida e que a saúde seja acessível a todos.

O papel do judiciário vai além de apenas determinar a entrega de medicamentos ou a realização de cirurgias e tratamentos, ele também atua na supervisão e na fiscalização das políticas públicas de saúde. Assim, certificando que elas sejam implementadas de forma justa e eficaz, respeitando os direitos dos cidadãos.

O guardião dos direitos à saúde

O Judiciário age como um verdadeiro guardião dos nossos direitos. Imagine que você precisa de um tratamento médico ou de um remédio específico, mas está enfrentando dificuldades para obtê-lo pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou pelo seu plano de saúde. Nessa hora, o Judiciário é o canal que você pode acionar para garantir seu direito à saúde. Ele assegura que todos tenham acesso aos cuidados necessários, sem distinção.

Como as associações atuam no judiciário e o que é o “amicus curiae”?

As associações podem atuar como amicus curiae (ou “amigos da corte”) no contexto do direito à saúde de diversas maneiras:

  1. Subsidiariedade e expertise: As associações muitas vezes têm um conhecimento especializado sobre questões relacionadas à saúde, seja por meio de pesquisas, experiência prática ou especialização profissional. Ao intervir como amicus curiae, elas podem fornecer informações adicionais e subsidiárias ao tribunal sobre questões técnicas, científicas ou sociais relacionadas ao caso em análise.
  2. Representação de interesses coletivos: As associações frequentemente representam grupos de indivíduos que compartilham interesses comuns, como pacientes com determinadas condições de saúde, grupos de defesa dos direitos dos pacientes, ou organizações que promovem políticas públicas relacionadas à saúde. Ao atuar como amicus curiae, essas associações podem representar esses interesses coletivos perante o tribunal, garantindo que as preocupações e necessidades desses grupos sejam consideradas.
  3. Fornecimento de perspectiva social: As associações podem trazer uma perspectiva social mais ampla para o caso, destacando as implicações das decisões judiciais sobre a saúde da população em geral, a equidade no acesso aos serviços de saúde e as políticas públicas relacionadas à saúde. Isso pode ajudar o tribunal a compreender melhor o impacto de suas decisões e a considerar as consequências sociais mais amplas.
  4. Promoção dos direitos fundamentais: As associações podem colaborar com o tribunal na defesa dos direitos fundamentais, como o direito à vida, à saúde e à dignidade humana. Ao apresentar argumentos jurídicos e informações relevantes sobre questões de saúde, elas podem contribuir para a proteção e promoção desses direitos perante o sistema judicial.

Em suma, as associações desempenham um papel importante como amicus curiae no direito à saúde, fornecendo expertise, representando interesses coletivos, trazendo perspectivas sociais e promovendo direitos fundamentais perante os tribunais. Suas intervenções podem enriquecer o debate jurídico e contribuir para decisões mais informadas e justas em casos relacionados à saúde.

Como acionar o Judiciário para garantir seu direito à saúde

Para acionar seu direito à saúde, a pessoa deve procurar um advogado particular ou um advogado público, por meio da Defensoria Pública, dependendo de sua capacidade financeira.

Se tiver condições de contratar um advogado particular, é preciso escolher um que tenha experiência em direito à saúde, para assim te orientar sobre as etapas do processo, na coleta de documentos e provas médicas necessárias. Caso não tenha recursos financeiros para isso, a Defensoria Pública pode ser acionada, ela oferece assistência jurídica gratuita, podendo ingressar com ações judiciais para exigir que o Estado ou planos de saúde privados cumpram com suas obrigações, assegurando que os pacientes recebam o tratamento adequado. Além disso, a Defensoria promove educação em direitos, conscientizando a população sobre suas garantias legais relacionadas à saúde.

. Em ambos os casos, é importante reunir relatórios médicos, exames e quaisquer outras provas que evidenciem a necessidade do tratamento de saúde reivindicado.

O que é a Defensoria Pública e como ela atua?

A Defensoria Pública é uma instituição essencial para a garantia do acesso à justiça e à defesa dos direitos das pessoas que não têm condições financeiras de contratar um advogado particular. Sua atuação visa assegurar o acesso à justiça e a igualdade de direitos, especialmente para aqueles em situação de vulnerabilidade social, como pessoas de baixa renda, mulheres vítimas de violência doméstica, crianças, idosos, pessoas com deficiência, entre outros.

A Defensoria Pública atua em diversas áreas do direito, incluindo direito civil, direito de família, direito do consumidor, direito penal, direitos humanos e direitos fundamentais, como o direito à saúde. Sua atuação envolve o patrocínio de ações judiciais, a prestação de assistência jurídica, a realização de mediação e conciliação extrajudicial, além de atividades de educação em direitos e promoção da cidadania.

Em termos de estruturação, a Defensoria Pública geralmente está organizada em níveis estaduais ou regionais, com unidades distribuídas em diferentes municípios ou regiões. Cada unidade é liderada por um defensor público, que é um advogado concursado e membro da carreira da Defensoria Pública. Além dos defensores públicos, a instituição conta com servidores administrativos e estagiários de direito, que auxiliam no atendimento e na prestação dos serviços jurídicos.

É importante ressaltar que a Defensoria Pública desempenha um papel fundamental na promoção da justiça social e na defesa dos direitos humanos, contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Concluindo

O judiciário é um aliado essencial no cumprimento dos direitos à saúde. Sua atuação não é apenas para resolver casos individuais, mas também para garantir que o sistema de saúde funcione de forma justa e eficiente para todos.

Por Érica Veiga Alves e Daniele Louise Kopp, sócias do escritório de advocacia Kopp & Alves Advogados

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Nota importante: As informações aqui contidas têm cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e/ou o tratamento médico. Em caso de dúvidas, fale com seu médico.

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