Exposição a partículas de poluição do ar pode aumentar a variabilidade clínica na fibrose cística
Comunicação IUPV - 10/07/2023 07:43Nanopartículas de carbono estão relacionadas a níveis reduzidos de proteína CFTR em estudo
A exposição a nanopartículas de carbono – minúsculas partículas de poluição do ar que representam uma parte substancial da poluição do ar em áreas urbanas – reduz significativamente os níveis de proteína CFTR, a proteína defeituosa na fibrose cística , de acordo com os resultados de um novo estudo.
A exposição a essas partículas de poluição do ar também aumentou os sinais de estresse celular, danos ao DNA e morte celular.
O estudo utilizou células das vias aéreas humanas cultivadas em uma interface ar-líquido e expostas ou não a nanopartículas de carbono por aerossol.
Os resultados sugerem que a exposição à poluição do ar, como nanopartículas de carbono, pode explicar a variabilidade clínica entre pessoas com fibrose cística, incluindo aqueles que possuem a mesma mutação causadora da doença, observaram os pesquisadores.
O estudo intitulado “Nanopartículas de carbono afetam negativamente a expressão de CFTR e vias toxicologicamente relevantes” ,foi publicado na revista Scientific Reports.
A fibrose cística é causada por mutações no gene CFTR, que fornece instruções para produzir a proteína de mesmo nome. A proteína CFTR é normalmente transportada para a superfície celular, onde regula o fluxo de íons e água através da membrana celular. Tal movimento de cloreto e água é necessário para a produção de muco no corpo.
Sem uma proteína CFTR funcionando adequadamente, o muco mais espesso se acumula em vários órgãos, incluindo os pulmões e o trato digestivo.
A alta variabilidade clínica – ou seja, uma ampla variedade de sintomas – é uma marca registrada da fibrose cística, mesmo entre pessoas com a mesma mutação no gene CFTR. Essa variabilidade sugere que fatores ambientais, como a poluição do ar, podem influenciar a gravidade da doença.
“Em áreas urbanas, a poluição do ar por partículas consiste predominantemente em partículas de carbono ultra finas derivadas da combustão”, escreveram os pesquisadores, acrescentando que essas nanopartículas “hoje, são bem reconhecidas por causarem efeitos adversos nas células pulmonares”.
Investigando os efeitos da poluição do ar na fibrose cística
Células das vias aéreas de pessoas com fibrose cística demonstraram ser mais suscetíveis à absorção e acúmulo de nanopartículas do que aquelas de pessoas sem a doença.
Pesquisas anteriores mostraram que os efeitos nocivos das nanopartículas de carbono estão ligados à inflamação e ao estresse oxidativo, um tipo de dano celular implicado na fibrose cística.
O estresse oxidativo resulta de um desequilíbrio entre a produção de moléculas potencialmente prejudiciais, chamadas espécies reativas de oxigênio, e a capacidade das células de se desintoxicarem com antioxidantes.
“Além dos efeitos prejudiciais ao DNA, as espécies reativas de oxigênio intracelular podem desencadear cascatas de sinalização que levam à produção e liberação de moléculas pró-inflamatórias”, escreveram os pesquisadores.
Foi demonstrado que a exposição à fumaça do cigarro reduz a produção de CFTR nas células das vias aéreas humanas, mas pouco se sabe sobre o efeito específico das nanopartículas de carbono nessas células, inclusive nos níveis da proteína CFTR.
Para resolver isso, uma equipe de pesquisadores na Alemanha avaliou os efeitos de nanopartículas de carbono puro em células epiteliais brônquicas humanas cultivadas em uma interface ar-líquido. As células epiteliais brônquicas, aquelas que revestem as principais passagens para os pulmões, formam a interface entre o ambiente externo e interno das vias aéreas.
Os resultados mostraram que uma exposição de quatro horas a nanopartículas de carbono fornecidas por aerossol prejudicou a integridade da barreira natural das células quando comparada com antes da exposição.
A exposição a nanopartículas de carbono também reduziu significativamente a atividade do gene CFTR e os níveis de proteína CFTR em cerca de 40% em relação à exposição ao ar limpo. Uma redução significativa nos níveis de atividade de dois modificadores genéticos da fibrose cística – TMEM16A em 60% e TNFAIP3 em 70% – também foi observada.
Modificadores genéticos são genes ou variantes genéticas que podem aumentar ou reduzir a gravidade de uma condição sem necessariamente causar a própria doença. TMEM16A codifica uma proteína que se mostrou crítica para a presença de CFTR na membrana celular. Enquanto isso, menor atividade do TNFAIP3 foi associada a pior função pulmonar em pessoas com fibrose cística.
Análises posteriores mostraram que a exposição a nanopartículas de carbono também foi associada a sinais aumentados de estresse oxidativo, morte celular e danos ao DNA. Isso foi avaliado pelo aumento da atividade de genes ligados a tais processos.
Notavelmente, “a exposição apenas à mistura de nitrogênio e ar não influenciou a integridade da barreira nem a atividade do gene, indicando que os efeitos observados estão relacionados a partículas”, escreveram os pesquisadores.
Essas descobertas destacam que a exposição a nanopartículas de carbono fornecidas por aerossol reduz a integridade da barreira e os níveis de proteína CFTR, ao mesmo tempo em que promove estresse oxidativo, danos ao DNA e morte celular em células das vias aéreas humanas cultivadas em laboratório.
“Esses efeitos, devido a fatores ambientais, podem explicar o desenvolvimento de diferentes gravidades clínicas em pacientes portadores da mesma mutação CFTR”, escreveu a equipe.
Mais estudos são necessários para confirmar essa associação e entender os mecanismos por trás dos níveis reduzidos de CFTR induzidos por nanopartículas de carbono e aumento do estresse celular, danos e morte, observaram os pesquisadores.
Fonte: https://cysticfibrosisnewstoday.com/news/exposure-air-pollution-particles-may-add-cf-clinical-variability/. Acesso em 24 de março de 2023.
Traduzido por: Mariana Camargo, biomédica, PhD e mãe da Sofia, diagnosticada com fibrose cística.
Revisão: Verônica Stasiak Bednarczuk de Oliveira, fundadora e diretora executiva do Unidos pela Vida, diagnosticada com fibrose cística aos 23 anos. Psicóloga, especialista em análise do comportamento, tem MBA em Direitos Sociais e Políticas Públicas e Mestranda em Ciências Farmacêuticas com ênfase em Avaliação de Tecnologias de Saúde pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
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Nota importante: As informações aqui contidas têm cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e/ou o tratamento médico. Em caso de dúvidas, fale com seu médico.