O papel do cuidador no enfrentamento da Fibrose Cística

Comunicação IUPV - 21/10/2019 11:40

Uma das principais preocupações na rotina da Fibrose Cística é o paciente, propriamente dito. Mas e a família? E seus cuidadores? Quem cuida de quem cuida? A psicóloga Tainá Fiabani, que também tem Fibrose Cística, fez o texto abaixo especialmente para nossa Coluna Científica, falando sobre este tema. Confira:

Por Tainá Fiabani

A Fibrose Cística é uma doença que não possui um diagnóstico imediato, podendo ser confundida com outras doenças do trato respiratório, como a asma. Os sistemas respiratório e gastrointestinal são os mais afetados pela doença e servem como base para o início do diagnóstico diferencial na Fibrose Cística. (CASTRO, FIRMIDA, 2011).
Segundo a Associação Brasileira de Assistência a Mucoviscidose (ABRAM), “a Fibrose Cística é uma doença genética, crônica, que afeta principalmente os pulmões, pâncreas e o sistema digestivo”. É uma doença grave e que não possui cura (Damião; Angêlo, 2011) e que “atinge cerca de 70 mil pessoas em todo o mundo, e é a doença genética grave mais comum da infância” (ABRAM, 2017).
Em se tratando da Fibrose Cística, é importante voltarmos nossa atenção também para aqueles que nos acompanham enquanto cuidadores, em sua grande maioria mães e pais. O papel do cuidador é fundamental para o sucesso na adesão e manutenção do tratamento em todas as fases da vida do portador. Por ser uma tarefa de muita responsabilidade, o cuidador também se desgasta e adoece. Não raro, pais e mães se sentem esgotados mentalmente.
Segundo os autores, Yamachita et al, (2010), “cuidadores familiares em geral constituem um grupo sujeito à sobrecarga, com vários problemas de saúde e, em muitos casos, sem auxílio e orientações”. Em sua maioria, os cuidadores possuem baixa escolaridade, em média de quatro a seis anos de estudo, e que não exercem nenhum tipo de atividade remunerada. De acordo com os autores, a baixa escolaridade desses indivíduos pode interferir no cuidado do familiar, pois muitas vezes não compreendem as prescrições médicas, quais cuidados devem ser realizados ou quais medicamentos devem ser administrados. (YAMACHITA Et al., 2010). Além das dificuldades de lidar com o tratamento, apresentam baixo entendimento da dimensão da doença.
Os portadores de Fibrose Cística demandam acompanhamento diário, principalmente cuidados com alimentação, fisioterapia respiratória e administração correta das medicações. A rotina da família se altera com a chegada da Fibrose Cística, além de exigir vigilância constante, pois o “relaxamento” de qualquer uma das atividades acima citadas pode comprometer a saúde do portador.  De acordo com o estudo de Alves e Bueno (2018), o cuidado com o paciente de Fibrose Cística exige, muitas vezes, uma alteração do cotidiano da família. Estudos relatam, através da fala dos familiares, que a sobrecarga da doença crônica recai sobre a figura materna, que geralmente é a principal cuidadora, tanto nos cuidados e procedimentos realizados, como na evolução do paciente. 
Ainda sobre a formação dos entrevistados, havia os que os eram alfabetizados e 29,3% possuía o ensino médio completo. Do total, 51% não trabalhavam fora do domicilio, sendo donas de casa, aposentados ou realizavam atividades extras no próprio lar, como costureiras. As profissões ou ocupações citadas pelos demais entrevistados foram agricultor, micro ou pequeno empresário, cabeleireira, recepcionista, professora, entre outras. (Alves S. P, Bueno D., 2018). Podemos concluir, que a maioria dos cuidadores não pode exercer atividades profissionais fora do lar, visto que cuidado demanda carga horária alta, impedindo-os de trabalhar externamente.
Os apontamentos da pesquisa acima citada ilustram a realidade da maioria dos cuidadores pelo Brasil, resultado semelhante a de outros estudos com diferentes doenças crônicas (Yamachita et al., 2010). Partindo deste princípio, é necessário que a equipe médica responsável pelo portador de Fibrose Cística, também inclua os familiares, sobretudo, o cuidador, no acompanhamento hospitalar. Segundo Alves e Bueno (2018), o cuidador principal deve ser o maior aliado dos membros da equipe multiprofissional que presta assistência ao paciente. Para isso, é imprescindível que os profissionais de saúde conheçam a família em todos os aspectos: sociais, emocionais e financeiros. 
Como profissional da saúde e portadora de Fibrose Cística, sinto que ainda existe muito pouco acolhimento por parte da equipe multiprofissional, tanto para o paciente quanto para o familiar. Lembramos que apesar de existir uma doença, todos somos seres humanos, cheios de sentimentos, dúvidas e incertezas em relação a nossas vidas. De acordo com os autores Ferreira, Martins e colaboradores (2012), o presente estudo demonstrou que a doença crônica exerceu efeito impactante no cuidador familiar do paciente. Este sentimento é importante na relação paciente-doença, que, geralmente, é negligenciado na prática clínica (FERREIRA, MARTINS, BRAGA et al., 2012).
Sabemos da necessidade de acolhimento e melhores esclarecimentos acerca da doença, fatos que evidenciam a necessidade de profissionais da saúde qualificados e preparados para atuarem no apoio dessas famílias, tanto na orientação sobre a rotina do paciente, quanto na escuta qualificada dos familiares, identificando as dificuldades apresentadas, investindo nas relações interpessoais e efetivando a assistência. (ALVES, BUENO., 2018). Conhecer e ampliar os aspectos positivos e as vivências agradáveis decorrentes do contato com a doença constitui uma possibilidade de cuidar. Cuidar do doente crônico e de seu familiar. (FERREIRA, MARTINS, BRAGA et al.,., 2012). Almeja-se  que os profissionais de saúde sejam sensíveis ao problema, respeitando os valores, crenças e sentimentos dos familiares, que convivem com a doença, muitas vezes, antes do diagnóstico ser confirmado, efetuando significativas mudanças a fim de garantir a assistência ao paciente. (COSTA; BRITTO et al., 2010).
Por: Tainá Fiabani, portadora de Fibrose Cística, Psicóloga clínica CRP 07/29977 e Mestranda em Psicologia Clínica pela Imed campus Passo Fundo/RS
Revisão: Verônica Stasiak Bednarczuk de Oliveira, psicóloga – CRP 08/16.156, especialista em análise do comportamento, fundadora e diretora geral do Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística, diagnosticada com FC aos 23 anos de idade.
Nota importante: As informações aqui contidas tem cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e ou, o tratamento médico. Em caso de dúvidas fale com seu médico, ele poderá esclarecer todas as suas perguntas.

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