Tratamento precoce com ivacaftor (Kalydeco) demonstra benefício em dois bebês com fibrose cística

Comunicação IUPV - 29/08/2022 07:55

O tratamento com o ivacaftor (Kalydeco), quando administrado antes de um ano de idade, demonstrou normalizar os níveis de cloro no suor, melhorar o crescimento e as funções pulmonares e pancreáticas em dois bebês com fibrose cística, reportou um estudo de caso. 

De acordo com os pesquisadores, os resultados demonstram que o ivacaftor (Kalydeco) “parece ser seguro e eficaz para bebês menores de 12 meses de vida. Os resultados ressaltaram os efeitos precoces e sustentados do medicamento, indicados especialmente pelo cloro no suor e função pancreática.”

O estudo chamado Efetividade clínica no mundo real do tratamento com ivacaftor nos primeiros 24 meses em dois bebês com fibrose cística e com diferentes mutações to tipo gating – estudo de caso.” foi publicado na revista científica Clinical Case Reports.

Sobre a fibrose cística

A fibrose cística é causada por mutações no gene regulador da condutância transmembrana da fibrose cística (CFTR), produtor da proteína CFTR, que funciona como um “portão” para regular água e sais para dentro e fora das células. A proteína CFTR não funciona normalmente na fibrose cística, gerando um aumento do muco mais espesso em vários órgãos. Em pacientes com mutação do tipo gating, o “portão” da proteína fica fechado.

O ivacaftor (Kalydeco), modulador da proteína CFTR comercializado pela empresa Vertex Pharmaceuticals, funciona mantendo esse portão aberto e por maiores períodos em pacientes com essa mutação (do tipo gating). Na Áustria, onde os bebês foram tratados, o medicamento é aprovado para tratamento de crianças com 12 meses ou mais, e com esse tipo de mutação. 

No Brasil, o ivacaftor (Kalydeco) foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2018 e recebeu recomendação final favorável da Conitec para incorporação no Sistema Único de Saúde (SUS) em 2020. Em 15 de agosto de 2022, a indústria fabricante do ivacaftor (Kalydeco), a Vertex Pharmaceuticals, enviou uma nota ao Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística, informando que os lotes do medicamento referentes ao contrato do Ministério da Saúde foram entregues. Com isso, os trâmites para distribuição nas Secretarias Estaduais de Saúde (SES) poderão ter início.

Em nosso país, o pedido de incorporação para o ivacaftor (Kalydeco) foi realizado com indicação para pacientes com diagnóstico clínico e laboratorial de fibrose cística e com idade igual ou maior de seis anos e, pelo menos 25 kg, que apresentem uma das seguintes mutações de gating (classe III) no gene regulador da condutância transmembrana da fibrose cística (CFTR): G551D, G1244E, G1349D, G178R, G551S, S1251N, S1255P, S549N ou S549R.

Estudo de caso

Este estudo de caso investigou o tratamento de dois bebês, ambos menores de um ano, com o ivacaftor (Kalydeco). Os dois apresentavam mutações diferentes, mas ambas do tipo gating. É importante notar que essas crianças foram tratadas apesar do medicamento não estar aprovado para a idade delas.

O diagnóstico de fibrose cística foi baseado nas medidas de cloro no suor – um marcador de função da proteína CFTR que mede a quantidade de sal no suor do paciente – no segundo mês de vida. A elastase fecal, marcador de função pancreática, estava baixa e o crescimento estava diminuído nesses bebês. Esses resultados foram suficientes para começar a terapia em um bebê de dois meses e em outro de 11 meses, com a dosagem de 50 mg duas vezes ao dia. 

Posteriormente, os pesquisadores verificaram o cloro no suor, a função pulmonar e  pancreática no dia 14, semana 4 e 16; e nos meses 10, 17 e 24 de tratamento (após dois anos). O crescimento e status nutricional também foram avaliados em todas as situações. 

Resultados

O primeiro bebê (de dois meses) respondeu rapidamente ao tratamento, e teve os níveis de cloro no suor normalizados após duas semanas e a função pancreática restaurada após quatro semanas. Ele também apresentou melhora na função pulmonar. Foi observado também aumento nos níveis de vitamina e o paciente cessou o uso de enzimas digestivas após quatro semanas de tratamento, assim como eliminou o uso adicional de vitaminas (exceto a vitamina D). O progresso do crescimento foi suficiente e o status nutricional foi melhorando no decorrer do estudo. 

No segundo bebê (de 11 meses), os níveis de cloro no suor diminuíram e permaneceram baixos até o mês 10, permanecendo dentro dos valores normais a partir de então. A função pulmonar permaneceu normal da semana 14 até a semana 24 (pouco mais de seis meses). A função pancreática (verificada pela elastase fecal) começou a aumentar após a semana 16, e no mês 17 o bebê deixou de tomar as enzimas pancreáticas. Os suplementos vitamínicos pararam de ser usados no mês 10. Além disso, o crescimento e ganho de peso se mantiveram na média de idade. 

“Neste estudo, nós comparamos os efeitos do ivacaftor (Kalydeco) em dois pacientes com diferentes mutações genéticas: um apresenta uma mutação S549N, e o outro apresenta a mutação G551D, ambas do tipo gating, sendo a segunda a mais comum”, disseram os cientistas. A redução do cloro no suor e melhorias nos níveis de elastase fecal no primeiro paciente, que começou mais cedo o tratamento, nos pareceu ter um efeito mais instantâneo,  apesar do impacto no segundo paciente ter sido mais tardio. Além disso, os efeitos na velocidade do crescimento estavam mais presentes no primeiro bebê.”

Notavelmente, os dois bebês mantiveram melhoras nos níveis de cloro no suor e na função pancreática, e não tiveram efeitos colaterais, de acordo com as análises laboratoriais. 

“Os moduladores altamente eficazes são capazes de manter a função pancreática, especialmente quando começam a terapia mais precocemente, e ainda a terapia de reposição enzimática pode ser finalizada”, disseram os pesquisadores. 

“A modulação da proteína CFTR com medicamentos como o ivacaftor (Kalydeco) é claramente um divisor de águas para a doença e deve ser reconsiderada nesses pacientes.” Por fim, os cientistas recomendaram estudos a longo prazo com o medicamento em crianças menores de um ano.

Fonte: https://cysticfibrosisnewstoday.com/2022/03/08/early-kalydeco-therapy-cf-benefits-2-infants-case-study/ . Acesso em 17 de maio de 2022. 

Referências:

https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/protocolos/20211230_portal-portaria-conjunta-no-25_pcdt_fibrose-cistica.pdf

Traduzido por: Mariana Camargo, biomédica, PhD e mãe da Sofia, diagnosticada com fibrose cística.

Revisão: Verônica Stasiak Bednarczuk de Oliveira, fundadora e diretora executiva do Unidos pela Vida, diagnosticada com fibrose cística aos 23 anos. Psicóloga, especialista em análise do comportamento, tem MBA em Direitos Sociais e Políticas Públicas e Mestranda em Ciências Farmacêuticas com ênfase em Avaliação de Tecnologias de Saúde pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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Nota importante: As informações aqui contidas têm cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e/ou o tratamento médico. Em caso de dúvidas, fale com seu médico.

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