No caminho para a cura: promovendo tratamentos para todas as pessoas com FC
Instituto Unidos pela Vida - 27/12/2016 16:30Os pesquisadores estão explorando tratamentos que mantenham as pessoas com fibrose cística o mais saudáveis possível, até que a cura seja encontrada. Na primeira sessão plenária da NACFC, dois cientistas dedicados à FC explicaram o progresso da pesquisa atual.
Ao longo dos últimos quatro anos, os moduladores da proteína CFTR (reguladora da condutância transmembrana) que restauram a função da proteína CFTR foram aprovados para mais de 50% das pessoas com fibrose cística. Este é um dos avanços mais emocionantes ocorridos na pesquisa em FC. Contudo, alguns indivíduos carregam mutações que não permitem que eles se beneficiem desses medicamentos. Tendo em vista esses indivíduos, a Cystic Fibrosis Foundation abriu a North American CF Conference (NACFC) deste ano.
Na primeira sessão plenária da NACFC, A Cure for All: Leaving No One Behind (Cura para todos: sem deixar ninguém para trás), dois experientes pesquisadores de FC esclareceram que uma ampla gama de estratégias vem sendo explorada para desenvolver tratamentos para todas as pessoas com FC, especialmente para aquelas que carregam mutações, que não se beneficiam do ivacaftor (Kalydeco®) e do lumacaftor/ivacaftor (Orkambi®).
Como diretora de pesquisas na Cystic Fibrosis Foundation, tenho o privilégio de trabalhar com os cientistas que estão focados em identificar novos alvos e desenvolver tratamentos. É gratificante ver o progresso ser alcançado em todas as frentes, e quero compartilhar alguns dos avanços no campo destacado durante a primeira sessão plenária com os doutores Eric Sorscher e Mitchell Drumm.
Primeiramente, os resultados laboratoriais preliminares indicam que os moduladores da CFTR de segunda geração serão mais efetivos que o ivacaftor e o lumacaftor/ivacaftor, e podem oferecer opções para pessoas com FC que têm apenas uma cópia da mutação F508del, de acordo com o Dr. Sorscher, da Georgia Research Alliance Eminent Scholar e Hertz Professor em Pesquisa em FC na Emory University, em Atlanta. Se os estudos clínicos dessas drogas forem bem-sucedidos, dentro dos próximos anos quase 95% das pessoas com FC poderão contar com uma droga focada na causa subjacente da FC.
Isso deixa 5% das pessoas com FC sem qualquer tratamento focado na causa subjacente de seus sintomas de FC, a proteína CFTR defeituosa. Mas estejam certos de que pesquisas estão sendo realizadas para garantir que ninguém – nem mesmo aqueles que têm as mutações mais raras – seja deixado para trás.
A proteína CFTR é fundamental na FC, porque regula o fluxo adequado de líquidos e sal (cloreto) dentro e fora das células que revestem os pulmões e outros órgãos. Visto que os moduladores da CFTR corrigem problemas da proteína CFTR, não ajudam às pessoas que têm mutações como as chamadas mutações nonsense, caso em que nenhuma proteína é produzida.
Em pessoas com FC que têm mutações nonsense, um sinal interrompe prematuramente a produção da proteína CFTR, resultando em uma proteína encurtada e não funcional. Além disso, o RNA mensageiro, que carrega as instruções genéticas para produzir a proteína, degrada antes que a proteína possa ser produzida.
A Fundação de Fibrose Cística (CFF) está apoiando vários esforços para encontrar compostos que possam estabilizar o RNA mensageiro e ler completamente os sinais de interrupção prematura de modo a produzir quantidades adequadas da proteína CFTR funcional. Vemos isso como uma entre as peças do quebra-cabeça, visto que nos esforçamos para cumprir o nosso objetivo de garantir a todas as pessoas que têm FC benefícios de tratamentos que restaurem a função da CFTR.
À medida que mais pessoas com FC cada vez mais jovens ganham o acesso aos moduladores da CFTR atuais e futuros, a saúde geral da população com FC melhorará antes da ocorrência de uma lesão pulmonar grave. “Nas próximas décadas, assistiremos à uma mudança significativa na demografia da população com FC”, disse o Dr. Sorscher, “mas agora precisamos nos concentrar no desenvolvimento de terapias com potencial de beneficiar todas as pessoas com FC hoje. Embora esperemos que as pessoas com FC passem a necessitar menos de tratamentos sintomáticos ao longo do tempo, o desenvolvimento de tratamentos melhores para lidar com as complicações da doença ainda é tão importante como sempre foi”, ele disse. “Reduzir a inflamação excessiva, combater infecções crônicas e melhorar a limpeza das vias aéreas permanecem principais prioridades.”
A inflamação excessiva é a principal causa de lesões no tecido pulmonar nas pessoas com FC. Pesquisadores da academia e da indústria estão investigando diferentes abordagens para reduzir a resposta inflamatória do organismo e impulsionar os processos naturais que ajudam a controlar a inflamação. Atualmente, a CF Foundation Therapeutics (CFFT) está fornecendo financiamento para o desenvolvimento clínico de cinco potenciais drogas anti-inflamatórias.
As infecções crônicas, especialmente por bactérias resistentes às drogas, são outra preocupação maior. Os pesquisadores estão testando novas formulações e novos usos para os antibióticos já existentes. Estão em curso estudos clínicos para uma versão inalatória do antibiótico vancomicina para o tratamento de infecções nas vias aéreas por Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA). Outro estudo clínico que recentemente começou a recrutar pacientes está testando o gálio, uma droga já aprovada pela U.S. Food and Drug Administration para outra doença, de uso intravenoso. O gálio é uma molécula que se mostrou capaz de matar as linhagens resistentes a antibióticos da Pseudomonas aeruginosa em laboratório, e que pode servir como uma nova opção terapêutica para pacientes com infecções de difícil tratamento.
Além disso, várias drogas estão em desenvolvimento para diluir ou modificar o muco espesso e viscoso nos pulmões de pessoas com FC, de modo que o mesmo possa ser expelido pela tosse com mais facilidade. Uma abordagem bloqueia a função de um canal de sódio encontrado nos pulmões, a fim de manter o fluido nas vias aéreas e ajudar a melhorar a limpeza destas.
“Nosso objetivo com todos esses tratamentos é manter pessoas com FC o mais saudáveis possível até que possamos oferecer a cura”, disse o Dr. Sorscher. Para fazer isso, a CF Foundation está financiando pesquisa fundamental em novas tecnologias para atacar o defeito básico na FC em todas as frentes.
O Dr. Drumm, um professor de pediatria e genética na Case Western Reserve University School of Medicine, explicou que a edição do gene da FC contém em si a promessa de uma solução permanente para a FC. Ele explicou o potencial da tecnologia de edição do gene CRISPR Cas9, que em anos recentes revolucionou a ciência, mas também ressaltou a dificuldade em transferir essa tecnologia do laboratório para a clínica.
Por exemplo, ainda não sabemos se uma edição funcionará para todas as mutações, ou se precisaremos corrigir cada uma das mais de 1.700 mutações na FC. Além disso, os cientistas ainda precisam determinar quais células são as melhores para estabelecer como alvos no pulmão, como alcançá-las com as ferramentas de edição do gene, e quantas células precisarão ser editadas para fazer uma diferença clínica.
Muitos desafios semelhantes se aplicam à terapia com RNA. A terapia com RNA envolve a adição de RNA mensageiro normal diretamente às células ou a reparação do RNA mensageiro defeituoso na célula para a produção de uma proteína CFTR normal. Embora essas opções terapêuticas representem uma melhoria em relação aos regimes diários oferecidos pelos moduladores da CFTR, corrigir o defeito básico no DNA ainda é o objetivo final para eliminar a doença completamente.
Nos últimos anos houve vários avanços significativos que mudaram o curso dessa doença, muitos dos quais pareciam impossíveis pouco tempo antes. Isso ocorre devido à dedicação de uma equipe de pesquisadores, profissionais de saúde e de pessoas com FC, todos trabalhando em conjunto para promover um objetivo comum. Embora tenhamos muito trabalho pela frente, este é de fato um dos momentos mais emocionantes para fazer parte da comunidade de pesquisa em FC.
Texto escrito por Ph.D.. Katherine Tuggle: Diretora de Pesquisas da Cystic Fibrosis Foundation. Katherine esteve envolvida com a pesquisa em FC desde 2009 como estudante de pós-graduação e como pós-doutoranda da Universidade do Alabama, em Birmingham. Em 2014, ingressou na Fundação para supervisionar os programas de pesquisa cientifica básica da instituição, incluindo 11 centros de pesquisa científica básica em todo o país. Ela também está envolvida em várias iniciativas da Fundação focadas no desenvolvimento e na validação de sistemas de modelos que podem ser usados em medicina personalizada. Em seu tempo livre, Katherine gosta de viajar com o marido e passar tempo com o seu pastor alemão.
Traduzido por Vera Carvalho | Voluntária de Tradução de Textos do Instituto Unidos pela Vida. Tem formação em história social com mestrado voltado ao abandono de crianças. Foi gerente de informação na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, onde recebeu as primeiras demandas por traduções de textos acadêmicos e científicos. A tradução tornou-se a sua principal atividade profissional há treze anos.
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Nota importante: As informações deste texto têm cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e ou, o tratamento médico. Em caso de dúvidas fale com sua equipe multidisciplinar, eles poderão esclarecer todas as suas perguntas!