Novo estudo indica que tratamento a longo prazo com Trikafta® traz benefícios para crianças com fibrose cística
Comunicação IUPV - 04/11/2025 07:00
O tratamento prolongado com o elexacaftor/tezacaftor/ivacaftor (Trikafta®) resultou em melhora da função pulmonar, redução dos sintomas respiratórios e redução dos níveis de cloreto no suor (níveis elevados são uma característica fundamental da fibrose cística) em crianças com a doença de 6 a 11 anos, de acordo com novos resultados de um estudo de extensão de dois anos.
Os dados mostraram que o Trikafta® foi geralmente bem tolerado, com um perfil de segurança consistente com o do ensaio clínico original e entre pacientes em faixas etárias mais avançadas.
“Esses resultados confirmam o perfil de segurança favorável e os benefícios clínicos duradouros do Trikafta® nesta população pediátrica”, escreveram os pesquisadores.
Os novos dados foram detalhados em “Elexacaftor/tezacaftor/ivacaftor em crianças com idade ≥6 anos com fibrose cística heterozigotos para F508del e mutação de função mínima: Resultados de um estudo de extensão aberto de 96 semanas”, publicado no European Respiratory Journal.
Trikafta® tem como alvo uma mutação genética comum observada em crianças com fibrose cística
Mutações que causam a fibrose cística prejudicam a função ou a produção da CFTR (condutor transmembranar de fibrose cística), uma proteína que normalmente ajuda a controlar o fluxo de água e sais para dentro e para fora das células. Sem a CFTR ativa, um muco espesso e pegajoso se acumula em vários tecidos e órgãos, especialmente nos pulmões e no trato digestivo. A Delta F508 é a mais comum entre as mais de 2.500 mutações causadoras da fibrose cística e é encontrada em cerca de 90% dos pacientes.
Trikafta® é uma terapia moduladora da CFTR que contém três ingredientes ativos projetados para aumentar a produção e a função da CFTR em pessoas com certas mutações causadoras da doença. É aprovada em muitos países para tratar pacientes com fibrose cística a partir dos 2 anos de idade que tenham pelo menos uma cópia da mutação Delta F508.
No Brasil, o Trikafta® está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) para pessoas com fibrose cística a partir de 6 anos que possuem pelo menos uma mutação Delta F508 no gene CFTR.
Para crianças de 2 a 5 anos, no Brasil, a versão em grânulos do medicamento já foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e precisará passar pela discussão em relação ao seu preço na Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). Depois, será necessário submeter à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) o pedido de avaliação para incorporação no sistema de saúde. Ainda não há previsão de quando a indústria fará a submissão para a CMED e do dossiê à Conitec.
Os benefícios a curto prazo da Trikafta® em crianças em idade escolar com fibrose cística, de 6 a 11 anos, foram demonstrados em um ensaio clínico de Fase 3b (NCT04353817). Todos os pacientes apresentavam uma cópia da mutação Delta F508e uma mutação de função mínima que resulta em uma proteína CFTR com função limitada. Os participantes foram aleatoriamente designados para receber Trikafta® ou placebo por 24 semanas.
Os dados finais mostraram que o Trikafta® melhorou a função pulmonar, reduziu os sintomas respiratórios e diminuiu os níveis de cloreto no suor, um sinal de uma proteína CFTR mais ativa.
Das crianças que concluíram o estudo de 24 semanas com os pais, 120 foram incluídas em um estudo de extensão aberto (NCT04545515, EudraCT, 2020-001404-42), no qual todas receberam Trikafta® por mais 96 semanas, ou quase dois anos.
Os dados mostraram que os níveis médios de cloreto no suor em crianças que fizeram a transição do placebo para Trikafta® no estudo de extensão caíram 57,3 mmol/L após 96 semanas. As crianças que continuaram com Trikafta® no estudo de extensão apresentaram uma redução média de 57,5 mmol/L nos níveis de cloreto no suor ao final de 96 semanas em comparação ao início do estudo, que serve como linha de base.
“Esses resultados sugerem que Trikafta® leva a melhorias rápidas e duradouras na função do CFTR em crianças com fibrose cística”, escreveu a equipe.
Função pulmonar apresentou melhora de mais de 6% em todas as crianças do estudo
A função pulmonar, avaliada pelo volume expiratório forçado em 1 segundo (VEF1), uma medida padrão usada na fibrose cística, apresentou melhora de 6,1% entre as crianças que fizeram a transição do placebo para o Trikafta®. Da mesma forma, houve melhora de 6,9% em comparação com o valor basal, ou seja, desde o início do estudo, em pacientes que foram tratados com Trikafta® durante todo o tratamento.
Os pesquisadores também examinaram o efeito do tratamento no índice de depuração pulmonar, conhecido como LCI. As medidas do LCI, escreveram os cientistas, “podem fornecer um meio mais sensível para detectar alterações precoces na função pulmonar e são consideradas uma medida de eficácia apropriada para crianças mais novas com doenças das vias aéreas”.
Em 96 semanas, a pontuação média do LCI diminuiu, o que significa que foram observadas melhorias, em 1,74 unidades para os pacientes que fizeram a transição do placebo para o Trikafta® e em 2,35 unidades para aqueles que continuaram com o Trikafta®.
Em comparação, crianças com fibrose cística que não foram tratadas com um modulador CFTR em um estudo de história natural apresentaram um aumento anual de 0,29 unidades LCI, afirmou a equipe.
O Trikafta® também aliviou significativamente os sintomas respiratórios auto relatados, conforme indicado por uma versão infantil do Questionário de Fibrose Cística Revisado (CFQ-R). As pontuações médias melhoraram em 6,6 pontos para crianças que iniciaram o tratamento com Trikafta® no estudo de extensão e em 2,6 pontos para aquelas que continuaram o tratamento a partir do estudo de base.
“Esses resultados demonstram que o Trikafta® leva a melhorias duradouras na função pulmonar e nos sintomas respiratórios em crianças com fibrose cística”, escreveram os pesquisadores. O medicamento foi geralmente seguro e bem tolerado por até 96 semanas de tratamento em crianças com 6 anos ou mais, com um perfil de segurança geralmente consistente com o perfil de segurança estabelecido para Trikafta®”, escreveram os pesquisadores.
Dados de mundo real brasileiros também demonstram resultados positivos em crianças
Um estudo brasileiro publicado em junho de 20252 avaliou a segurança e a tolerabilidade do Trikafta® em crianças e adolescentes com fibrose cística em um centro de referência nacional no Brasil. Foi avaliada uma coorte de 39 pacientes (idade média: 11,7 anos) em uso do medicamento há pelo menos três meses, e melhoras significativas foram observadas no escore Z de peso em três meses (p = 0,046) e seis meses (p = 0,018), bem como no ganho de peso absoluto (p < 0,001).
A altura apresentou crescimento absoluto, mas sem alterações significativas nos escores Z. A concentração de cloreto no suor diminuiu em 52,8 mmol/L (p < 0,001). As exacerbações pulmonares e o uso de antibióticos diminuíram significativamente (p < 0,001 para ambos). Apesar das limitações na coleta de dados de espirometria, os valores de VEF1 mostraram um aumento mediano de 6 pontos percentuais.
As culturas de swab orofaríngeo para positividade de Pseudomonas aeruginosa caíram de 43,6% para 5,1%. As avaliações de segurança mostraram um aumento transitório na fosfatase alcalina (p = 0,011), mas nenhuma hepatotoxicidade significativa.
Os eventos adversos mais comuns foram aumento das secreções respiratórias (25,6%) e dor abdominal (15,4%). Ocorreram uma suspensão temporária do tratamento e uma redução da dose, mas nenhum paciente necessitou de descontinuação permanente. Esses achados, associados ao que tem se observado na prática clínica e relatos de pacientes e familiares, estão alinhados com a literatura existente, corroborando o papel do Trikafta® como terapia transformadora no tratamento da fibrose cística pediátrica.
Texto traduzido de: https://cysticfibrosisnewstoday.com/news/cf-children-found-benefit-long-term-trikafta-treatment-study/
2: Martins GDS, Rambo C, Spessatto G, et al. Efficacy and safety of using Elexacaftor/Tezacaftor/Ivacaftor in the treatment of children with cystic fibrosis: real-world evidence from Brazil. J Pediatr (Rio J). 2025;101(5):101420. doi:10.1016/j.jped.2025.05.007
Revisão e tradução: Mariana Camargo, biomédica, PhD e mãe da Sofia, diagnosticada com fibrose cística.
Revisão: Verônica Stasiak Bednarczuk de Oliveira, fundadora e diretora executiva do Unidos pela Vida, diagnosticada com fibrose cística aos 23 anos. Psicóloga, especialista em análise do comportamento, tem MBA em Direitos Sociais e Políticas Públicas, Mestre e Doutoranda em Ciências Farmacêuticas com ênfase em Avaliação de Tecnologias de Saúde pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Quer fortalecer o trabalho realizado pelo Unidos pela Vida? Clique aqui e escolha a melhor forma de fazer uma doação.
Nota importante: As informações aqui contidas têm cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e/ou o tratamento médico. Em caso de dúvidas, fale com seu médico.